Origem
O registro mais antigo encontrado deste meme é uma publicação feita no Twitter, no dia 30 de março de 2016, por André Dahmer. Em um tom inconformado, o tweet opina que “a crise também é estética”, ao compartilhar a notícia: “Artista holandês acusa Fiesp de plagiar pato amarelo”.
Difusão e Repercussão
Como apontamos na “Origem", o registro mais antigo encontrado deste meme é uma publicação feita no Twitter, no contexto de apreensão com a intensa crise econômica e política, uma das consequências do processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff.
Salientamos que neste caso a antiguidade não garante a certidão de origem, uma vez que é somente o resultado mais antigo que as ferramentas virtuais de busca nos permitiram acessar. A expressão “a crise também é estética”, por exemplo, não é rastreada pelo Google Trends. Entretanto, a mesma plataforma de buscas nota a presença da expressão “a crise é estética”, na internet, desde pelo menos 1º de maio de 2016 até o presente momento, em outubro de 2020. Sendo assim, “a crise é estética” é adotada como título por ser a forma mais elementar do meme.
A crítica ao mau gosto e ao plágio na primeira aparição encontrada do meme dá o tom de seu uso. As características atribuídas a este mau gosto incluem o exagero nas cores, a combinação deslocada de elementos diferentes, as montagens de qualidade secundária, a cópia mal feita, imagens pixeladas, o exagero emocional e o sensacionalismo, dentre outras.
Além de algumas brincadeiras a respeito de camisas de times de futebol ou tendências da moda tidas como feias, os alvos do juízo estético-político do meme são, sobretudo, os padrões estéticos usados por membros, eleitores e ações do novo campo político estabelecido pelo atual Governo Federal: as combinações inusitadas de trajes e de alimentos na mesa de café do presidente; as roupas, calçados e acessórios com as cores vivas da bandeira brasileira usadas pelos apoiadores do atual governo; o design gráfico da logo de ministérios e programas do Governo Federal; a atuação dos ministros da Educação e da Cultura; o tratamento dado às políticas públicas voltadas às artes; a aparência da nova nota de 200 reais; etc.
Ao diagnosticar que além de sócio-político-econômica “a crise é estética”, o meme levanta indiretamente a questão sobre o que é ou não belo e de bom gosto. Esta mesma questão deu origem, no século XVIII, à palavra “estética”, herdeira de sua raiz etimológica grega antiga “aisthesis” (sensibilidade, sensação). Assim, surge a Estética como disciplina filosófica que reflete acerca da nossa relação sensível com as artes. Buscando definir seus próprios critérios de trabalho, tanto a arte quanto a Estética passaram por sucessivos momentos de crise e inumeráveis debates: sobre o que é ou não arte, sobre a universalidade do belo e do gosto, sobre a reprodutibilidade técnica das obras de arte, sobre seus usos comerciais e ideológicos, sobre os mecanismos de distinção sócio-política-econômica que residem no consumo da arte e sobre seu dever ou não de engajar-se em causas práticas, por exemplo.
Como se vê, as questões estéticas permeiam o mundo social e político. Nosso meme é mais um caso disto. Vale considerarmos que uma comunidade política costuma trazer consigo também acordos estéticos sobre o bom gosto e sobre os modos de se sentir. Assim, comunicar publicamente um juízo de gosto, como “a crise é estética”, pode ser considerado um juízo político, pois usa como ferramenta de persuasão pública contra um regime político uma crítica ao regime estético que o acompanha. Oportunamente surgiram publicações em jornais, revistas, podcasts e vídeos realizando um tipo de autorreflexão do meme.
Gêneros e formatos
Este é um meme do gênero discussão pública, pois faz referência ao debate público sobre o alcance da atual crise brasileira. Quanto aos formatos, encontramos a catchphrase (bordão): “a crise é estética". Quando variações são apresentadas podemos considerar a presença do formato snowclone: “a crise é, acima de tudo, estética”, “a crise é, antes de tudo, estética”, “a crise é, sobretudo, estética” e “a crise é também estética”.
O elemento básico do uso do meme é a reprovação de uma proposta estética, seja em um tom mais sério de crítica negativa a alguma medida governamental voltada à arte e à cultura no Brasil, seja como brincadeira para mostrar uma opinião sobre o mau gosto ou a inadequação estética de algo ou de alguém. Assim, notícias, imagens ou vídeos são publicados contendo o meme como legenda ou como parte de um comentário mais amplo.
